Governador privatiza Sabesp e conta de água já aumenta 6%
Quem é contemplado pelo sistema de abastecimento da Companhia de Saneamento Básico do Estado – Sabesp, sabe que, se consumir até 10 m³ de água, pagará a taxa no valor de R$ 78. Isso significa que se consumir apenas 3 m³ de água, pagará o mesmo valor. Se não consumir nada, paga do mesmo jeito.
Muita gente questiona isso há anos – sem contar as tubulações velhas que mesmo sendo trocadas apresentam problemas e vários hidrômetros que, deixam o ar passar e claro, acabam gerando um consumo extra para quem paga. Ultimamente, por conta do racionamento de água – que ocorre mesmo com o nível das represas acima da média – todo dia à noite a água é cortada por volta das 22h, retornando apenas às 3h.
Sem contar as manutenções realizadas sem programação e que deixam boa parte da população sem água o dia todo. A última ocorreu no Tatuapé e adjacências, no dia 23/06, durando quase 24 horas. E não houve qualquer aviso sobre a manutenção, causando surpresa e dificuldade à boa parte dos moradores.
Desperdício de 34%
Hoje, conforme dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento – SNIS, dos 46,2 milhões de moradores do estado, 96,5% têm acesso ao sistema de rede de água, 90,6% habitam em residências com sistema de rede de coleta de esgoto, e por fim, 69,6% do volume de todo esgoto gerado no estado é tratado. Por sua vez, as perdas de água nos sistemas de distribuição são de 34,4%. Essas perdas podem ocorrer por causa de vazamentos, canos que se racham ou quebram ou ainda, fraudes cometidas por quem tenta manipular o hidrômetro tentando obter vantagens na conta.
Capital aberto desde 1997
A empresa possui capital aberto na bolsa de valores, sendo listada na B3 com o código SBSP3. Já naquela época, o Governo Mário Covas (PSDB) desejava a privatização da Companhia. Em 2004, na Gestão Geraldo Alckmin (PSDB), a empresa estreou na bolsa de valores de Nova Iorque, a NYSE, através de ADS (American Depositary Stocks).
Atualmente, a Sabesp é sócia também das empresas Aquapolo Ambiental; Attend Ambiental e Paulista Geradora de Energia. Só no Estado, a empresa é considerada líder em saneamento, tendo um faturamento de 22 bilhões de reais em 2022. Desse montante, 25% (R$ 741,3 milhões) foram revertidos como dividendos aos acionistas, e R$ 5,4 bilhões, destinados a investimentos.
E por que privatizar, afinal?
Atualmente, o Governo do Estado detém 50,3% do controle da Companhia, sendo o restante negociado nas bolsas brasileira (B3) e americana (NYSE). Se a Companhia cresce e obtém um lucro óbvio com o serviço prestado no Estado – apesar de muitas falhas – qual o interesse por trás da privatização? Quem garante, afinal, que o serviço será bem executado pela empresa que adquirir as ações do Governo?
O patrocinador da proposta de privatização da Companhia é o próprio Governo do Estado. Segundo a assessoria: “Não há condições de o Governo atingir as metas de universalização no fornecimento de água e coleta de esgoto, se não houver maior participação da iniciativa privada. A única forma disso ocorrer é através da privatização”.
Aprovação polêmica e rápida
Para tanto, em dezembro de 2023, a Assembleia Legislativa do Estado aprovou por 62 votos contra 1, o projeto de lei que permite ao Governo – acionista majoritário – vender as suas ações da Companhia no mercado. No mesmo mês, sem delonga, o projeto foi sancionado pelo Governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).
“Aqui no Brasil, é tudo rápido e sem muita discussão e isso pode gerar problemas futuros. Eu não sou contra a privatização, muito pelo contrário, sou contra o governo fazer do jeito dele, de forma até autoritária e fazer com qualquer um, tipo, pagou, levou, não se importando com a população. A privatização é positiva sim, mas tem que ver quem vai adquirir, se tem competência para tal, qual o histórico da empresa no ramo, porque senão, teremos os mesmos problemas com uma ‘Enel 2’ ou uma ‘Segunda Telefônica’ e sempre pagando caro por isso”, afirma Maurício Toledo, advogado especialista em direito público.
Segundo a assessoria do Governo: “O Governo não quer vender todas as ações e não quer ‘abandonar’ a Companhia, pelo contrário, a intenção é manter entre 15 e 30% a sua participação na Sabesp, mantendo o direito de veto e passando uma parte destas outras ações à iniciativa privada”, afirma.
Redução da conta só com ajuda da estatal
Um estudo preliminar realizado pela International Finance Corporation (IFC), instituição do Banco Mundial, aponta que a redução da tarifa somente acontecerá com a ajuda Estatal, uma vez que os custos para cumprir a meta de universalização do saneamento são altos.
Ou seja, será realmente necessário que o Governo cumpra o que está prometendo. Se não cumprir, além das taxas não reduzirem , todo cronograma de entrega das metas de saneamento estará comprometido.
Para o comerciante e fotógrafo Wilson Dias, a expectativa não é das melhores: “Eu não acredito neles. A Enel faz um trabalho péssimo e é da iniciativa privada. A diferença é que se você desliga o relógio, você tem desconto na conta ou simplesmente não paga o que não consome. A Sabesp, não. Você fecha o registro e paga a taxa, mesmo sem consumir nada. É um absurdo. Outra coisa, a Enel leva horas para atender quando falta força. O último temporal que teve, esse ano, ficamos quase dois dias sem energia. Eu, realmente, temo pela privatização da Sabesp e que isso resulte em contas bem mais caras”, desabafa.
Municípios aderem à privatização
Após sanção do Governador Tarcísio de Freitas, a Sabesp tentou renegociar seus acordos com todos os 375 municípios atendidos, no sentido de que a privatização possa ocorrer. Isso porque inúmeros contratos têm durações distintas, sendo o de Osasco, por exemplo, o próximo a vencer em 2029.
Assim, no dia 20 de maio, 304 municípios paulistas já aprovaram um contrato único com a Sabesp, iniciando a criação de um conselho deliberativo que visa discutir as propostas de avanço na área de saneamento básico no Estado.
Desta forma, tais contratos de fornecimento de água e coleta de esgotos passarão a ter validade até 2060. Por sua vez, 18 municípios se posicionaram contrários à privatização, sendo alguns deles Mauá, Ilhabela, Franco da Rocha, São José dos Campos, dentre outros.
Em nota, o governador Tarcísio disse: “Obviamente, é um projeto que tem sua complexidade, mas vamos debater e explicar o quanto for necessário para mostrar as vantagens do que está sendo construído”.
Privatizou e a conta já aumentou
Enquanto os discursos são de um jeito, na prática, as contas de água já tiveram aumento de 6,4%, aprovado pela Arsesp – Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo, no último dia 10 de maio. O aumento abrange todos os municípios operados pela Companhia.
Será que mesmo após a privatização, a tão sonhada redução de tarifa e principalmente, a universalização do saneamento básico no Estado, serão metas concluídas pelo Governo? Ou será apenas mais uma promessa de campanha para atender às expectativas de investidores e empresários do setor?
Se for bem organizado, o processo pode ser elogiado. Se ficar só na palavra, o governador Tarcísio de Freitas pode pagar caro nas urnas, em 2026.